Modelos de Distribuição de Lucros
De acordo com a OAB, atualmente no Brasil há 1 advogado para cada 190 cidadãos. Há dez anos, a proporção era de 1 advogado para cada 320 cidadãos. E, sem dúvida que, há muitos anos essa proporção era menor ainda...
E como isso se relaciona com os modelos de distribuição de lucros?
A resposta é a competitividade interna e externa (interna: dentro do escritório entre os sócios e externa: fora do escritório com os demais escritórios de advocacia)... Com uma maior oferta de profissionais disponíveis, houve a necessidade de modificar as formas de ingresso, saída e retenção de sócios nos escritórios de advocacia também impactando em como distribuir os lucros da sociedade.
Conhecendo esses números fica mais simples entender que no passado a variável da reputação dos sócios tinha um peso maior do que atualmente e consequentemente o modelo de distribuição de lucros que era adotado ponderava muito mais para essa variável do que para qualquer outra da sociedade.
Sabe-se que o modelo de distribuição de lucros de uma sociedade representa muito mais do que uma conta a ser feita no fechamento do período. Ele representa o que a sociedade acredita em termos de valores e quais objetivos tem para o negócio. Através dele, consegue-se analisar e entender a sociedade, o negócio e por fim, até o quadro de sócios. Ou seja, a cultura e a dinâmica da empresa refletem o modelo de distribuição de lucros adotado e vice-versa.
A citar como exemplo, uma sociedade agressiva comercialmente certamente possui um modelo de distribuição de lucros meritocrático. Nesse modelo, é comum ver que a competitividade interna é grande e os negócios podem não ser tão diversificados quanto aos outros modelos, pois se o foco é garantir resultados, são as práticas já consolidadas que os trazem.
Já uma sociedade que trabalha forte na melhoria de processos administrativos e de gestão, provavelmente adota um modelo de distribuição de lucros onde o coletivo tenha um peso maior que o resultado individual. É comum esse tipo de sociedade formar equipes de trabalho para implementação de inovação na busca de novos horizontes e, portanto, ter atuação em frentes mais diversificadas do que num modelo meritocrático.
Nessa altura, conclui-se que a escolha de qual modelo é o mais adequado para cada escritório de advocacia é extremamente complexa, pois são vários os fatores que devem ser ponderados para que o resultado almejado seja atingido e traga o melhor da equipe para a perenidade e crescimento do negócio.
Pensando assim, algumas questões devem ser exaustivamente discutidas:
O que tem mais valia para o escritório, o sócio captador e agressivo comercialmente ou o formador de equipe?
Como valorar e ponderar sobre dois tipos de sócios (captador e formador de equipe)?
Como fica o rateio administrativo do escritório?
Os sócios que iniciaram a sociedade têm uma importância maior para o resultado atual do escritório? Se sim, de quanto?
Quais sócios devem ratear o custo fixo do escritório e em qual percentual?
Quais métricas de produtividade de faturamento devem ser medidas e adotadas para cálculo da distribuição de lucro?
Nessas poucas perguntas já se nota que a escolha do modelo de distribuição de lucros é quase que um sumário de missão e valores da sociedade, que colocadas e respondidas juntamente com outras, formula a bonificação dos sócios.
Entrando nos modelos existentes, provavelmente, uma sociedade que valoriza os pioneiros, adota um sistema de distribuição de lucros pela senioridade, chamado de “lockstep”. Já a sociedade que valoriza o desempenho individual independente do “tempo de casa”, talvez adote o sistema denominado “eat what you kill”. Mas além desses dois modelos, há vários outros no mercado. Nenhum deles é certo ou errado, são diferentes e refletem as sociedades conforme a “filosofia administrativa” do grupo de sócios.
Abaixo uma explanação simples sobre esses modelos conhecidos nacionalmente e internacionalmente, juntamente com suas principais características de distribuição de lucros:
Lockstep (tropicalizado – Por Senioridade/Tempo de Casa)
Modelo de distribuição de lucros bastante tradicional, que se baseia unicamente na senioridade dos sócios para o rateio final dos lucros. Os sócios mais antigos recebem os maiores percentuais e os mais novos os menores. Nesse modelo, a remuneração caminha lado a lado com o tempo de casa dos sócios. Os valores são conhecidos pelos sócios que ingressam, portanto não há surpresas e nem mistérios envolvidos no cálculo, fornecendo transparência total no que se refere à participação no lucro. Como exemplo, as faixas de senioridade podem ser separadas por grupos de 5 em 5 anos, formando grupos de sócios com 1 a 5 anos de casa, 5 a 10 anos e 15 e mais anos.
Esse é o tipo de modelo que encoraja a concorrência externa (entre os escritórios de advocacia) ao invés da interna (entre os sócios) uma vez que a única ferramenta para incremento de participação nos lucros é ficando mais tempo na sociedade.
Eat what you kill (tropicalizado - Meritocracia)
Como o próprio termo indica, cada sócio recebe sobre o montante “trabalhado”. É um sistema que prioriza o desempenho individual e não cotas societárias e nem senioridade. Geralmente, os escritórios de advocacia que adotam esse sistema, possuem uma curva de crescimento de faturamento mais rápida e focado do que os demais modelos, já que atrai profissionais com perfil comercial mais agressivo.
Outra característica que geralmente é considerada nesse modelo de distribuição de lucros é que cada sócio é responsável pelo pagamento de uma parcela do “overhead” do escritório bem como do marketing, secretária e equipe de apoio formada por advogados júniors ou estagiários, que são contratados diretamente pelo escritório, mas cobrados de cada sócio conforme utilização para os clientes.
Existe também a prática interna de “comercialização” de clientes, quando se fixa um fee para repasse de um cliente / conta para outro sócio.
É um modelo baseado em interesse individual sendo que a coletividade não é considerada quando se discute distribuição de lucros.
Equal Partnership (tropicalizado - Igualdade dos Sócios)
Nesse caso, a sociedade é formada por grupos que são divididos pela sua senioridade, onde os seniores possuem participação maior na distribuição de lucro do que os juniores. Dentro de cada grupo, todos os sócios possuem a mesma participação. Portanto, há a formação grupos heterogêneos entre si e homogêneos deles. Diferente do “lockstep” em que
Algumas sociedades adotam, além dos sistemas de grupos, uma possibilidade de mobilidade de sócios entre os grupos, ou seja, permitem que os sócios migrem de grupos anualmente com base em performance individual.
No Equal Partnership, o montante faturado interfere mais nos ganhos de cada sócio do que a performance individual.
Hale and Dorr System (tropicalizado - Flexível)
Hale and Dorr, um tradicional escritório de advocacia de Boston, que originou esse modelo, sendo que é tido como o primeiro escritório a adotar um sistema de incentivo baseado em categorias de atuação dentro do escritório de advocacia. O sistema segmenta os sócios em 3 grandes grupos: o “finder” que trouxe o cliente, o “minder” que cuida do cliente e o “grinder” que executa o serviço propriamente dito. Nesse modelo, os percentuais variam, podendo ser por exemplo, 10% para “finders”, 20% para “minders” e 60% para “grinders” e os últimos 10% para somar 100%, para ser distribuído baseado em performance individual.
Nesse modelo, a atuação prática no exercício da profissão tem um peso maior, permitindo então que quem trabalha mais, recebe mais. O domínio em relação ao que se ganha financeiramente é de cada sócio, não gerando desconforto para o time uma vez que quanto mais o sócio se envolve, mais ele recebe.
The Simple Unit Formula (tropicalizado – Fórmula de Pontuação)
Esse é o modelo que foi estruturado com base em pontuação através das diversas atividades dos sócios, tanto as relacionadas diretamente com o faturamento dos clientes quanto as que não recebem faturamento diretamente. É um modelo que trabalha com diversas variáveis, cobrindo as diferentes necessidades da sociedade: senioridade, produção, captação e atividades não faturadas, que são mensuradas e pontuadas. Por exemplo, cada ano trabalhado na sociedade vale um ponto. Um determinado valor de faturamento recebe outro ponto, um cliente captado recebe mais x pontos e assim por diante. No final, a soma de todos os pontos determina o percentual de lucro a ser recebido por cada advogado.
Esse sistema de cálculo difere um pouco do anterior (Hale and Dorr) porque coloca na “conta” a senioridade do sócio uma vez que quanto mais tempo na sociedade, mais pontos recebe.
The 50/50 System Subjective/Objectiv (tropicalizado - 50% Subjetivo, 50% Objetivo)
Esse sistema de distribuição de lucros valoriza tanto os aspectos objetivos quanto os subjetivos da sociedade em igual proporção. Isso quer dizer que metade da remuneração é oriunda diretamente do quantitativo e a outra metade do qualitativo. No que se refere ao aspecto objetivo, 40% da remuneração é calculada a partir dos dados de faturamento da carteira de clientes do sócio e os outros 10% vindos de outras métricas relacionadas aos clientes,
somando então os primeiros 50% Objetivos. Já os outros 50% vindos da metodologia Subjetiva, se formam a partir de 10% da percepção sobre a habilidade do sócio em lidar com os clientes e os últimos 40% através de outros critérios subjetivos que cada sociedade pontua como importante.
Ou seja, é um critério que conjuga duas metodologias opostas (subjetivo e objetivo), que, portanto, não pende exclusivamente para um formato de distribuição específico, mas que em contrapartida, precisa lidar com as questões complexas de definição de qual detalhamento faz parte de cada um deles. É preciso ressaltar que os 50% são fixos, mas o “drill down” dentro de cada um dos quesitos (subjetivo e objetivo) é definido caso a caso, cada escritório determina o que mais faz sentido conforme a realidade societária de cada um. Os dados acima de 10% e 40% são um exemplo de divisão.
Team Building System (tropicalizado – Formação de Time)
Se existe um modelo de distribuição que se opõe ao conhecido “eat what you kill” é o Team Building System. Nele, o primordial é a saudabilidade financeira do negócio e o trabalho em equipe. A performance individual também é ponderada, porém com uma importância bem menor do que as demais.
Esse sistema premia principalmente quando o todo (escritório) está gerando receita suficiente, participando com 50% do potencial.
As bases de compensação financeira dos sócios são formuladas com 50% oriundas da saúde financeira do escritório, 40% das práticas relacionadas ao grupo ou à métricas desenvolvidas e ponderadas também pelo aspecto financeiro do grupo e os últimos 10% na performance individual dos sócios.
Dessa forma, os sócios recebem financeiramente quase o mesmo valor já que o peso de 50% está relacionado ao desempenho do escritório como um todo. As variações de valores recebidas entre eles são pequenas, o pode frustrar alguns deles. Mas por outro lado, existe a formação tanto de uma empresa saudável e perene quanto uma equipe de trabalho coesa e unida já que o coletivo também recebe boa parte da distribuição dos lucros.
Nesse sistema, a senioridade não faz parte da conta. Os novos integrantes da sociedade entram e passam a receber com base na mesma fórmula de distribuição de lucros que os sócios mais antigos.Após a leitura de todas essas opções de sistemas de distribuição de lucros, a conclusão que se chega é a de que as opções são variadas, contemplando mais ou menos atividades individuais, coletivas, formação de time, concorrência interna, concorrência externa, tempo de casa, saudabilidade financeira do escritório e tantas outras que podem ser exploradas conforme cada sociedade entender ser o melhor.
Vale destacar dois desafios para definição do “melhor” modelo de distribuição de lucros e uma recomendação:
- Dependendo do número de sócios e interesses de cada um, agradar gregos e troianos é uma missão bastante arrojada. Tendo em vista perfis, personalidades e intenções diversas dentro de um grupo, é comum que um dos grandes desafios seja justamente encontrar o equilíbrio para que, cada um cedendo um pouco, o acordo poderá ser firmado
- Além da eleição de qual sistema, as métricas que o compõe é o segundo desafio. Tanto quais quanto qual % cada uma deverá participar da conta.
Em função da imparcialidade e conhecimento de mercado, é altamente recomendada a contratação de consultoria especializada em gestão de escritórios de advocacia, com experiência suficiente para harmonizar e percorrer as alternativas possíveis para que, com as informações em mãos, garanta o “melhor” modelo que represente o maior número de interesses dos sócios e da sociedade.
O certo é o que for melhor para os sócios e a sociedade!
E, para encerrar, todo e qualquer modelo societário deve ser escolhido considerando os objetivos estratégicos do escritório de advocacia. Por exemplo: escolher um modelo de Distribuição de Lucros totalmente meritocrático e ter como planejamento estratégico foco em formação de time, desenvolvimento técnico da equipe e/ou ajustes dos processos administrativos, pode gerar frustrações na análise final do ano.
A BÓREA, consultoria especializada em gestão de escritórios de advocacia, é liderada por Mario Esequiel, que atua há anos no mercado jurídico, possuindo experiência em grandes escritórios de advocacia, e pode apoiar a gestão do seu escritório.